Quem é Mr. Nice?
Tem a voz grave, fala pausadamente, sorri. É um senhor caloroso de quase 70 anos, muito agradável, que fala da sua vida sem tapujos nem arrependimentos. Estudou Física na Universidade de Oxford, foi professor e dedica-se a escrever. Para além disso, está na música actualmente e é comediante de stand up. Ele mesmo, até há uns anos atrás controlava aproximadamente 10% do tráfico mundial de marijuana e haxixe e tinha negócios com a IRA, MI6, a CIA ou a Yakuza, entre outros. É Howard Marks.
A importância da Universidade
Howard Marks nasceu num pequeno povoamento mineiro de Gales, filho de uma professora e um capitão da marinha mercante. Para além de ter tido uma formação docente, graduou-se como Físico Nuclear e fez depois um postdoc em Filosofia da Ciência em Oxford. Foi também ali onde provou pela primeira vez a marijuana e ficou fascinado.
A marijuana era um produto bastante caro que se consumia principalmente em círculos universitário. Mas para Howard parecia-lhe como se um tesouro tivesse sido deixado ali para ser consumido por toda a gente. E assim começou. No início vendia apenas pequenas quantidades de marijuana aos seus amigos e formou de seguida uma sociedade com 3 amigos, com quem conseguiu expandir o seu negócio atráves de Oxford, Londes e Brighton.
Negócios e adrenalina
A sua grande experiência como traficante foi em Frankfurt, da mão de Graham Plinston, que o tinha ajudado a sair da cadeia. Ficou entusiamado pela adrenalina que sentia ao cruzar cada fronteira, cada controlo. Começou a estabelecer uma rede de contactos internacionais, desde a Nova Zelândia ao Paquistão, através daqueles com quem conseguisse obter grandes quantidades de marijuana e hash que vendiam de seguida em Londres. Ganhavam muito dinheiro, mas eram os contrabandistas que ficavam sempre com a maior percentagem. Sendo que procuraram outros sócios.
Deste modo, Howard conheceu James McCann, membro da IRA e traficante de armas. Por ter uma afinidade política de esquerda e pela luta pela liberdade, as activades de McCann não lhe provocavam nenhum problema moral para Marks. Para além disso considerando que ele tinha os contactos suficientes para conseguir a marijuana e que McCann teve o seu próprio mercado de contrabando na Irlanda via área, começaram a fazer negócios juntos. Tal foi uma aproximação na sua colaboração que até aos dia de hoje os filhos de ambos são amigos.
Grandes contactos, grandes negócios
A sua formação universitária, os seus contactos com produtores de haxixe do Líbano, Paquistão e Afeganistão, os seus contactos com a IRA, e sua personalidade carismática fizeram com um ex-companheiro de Oxford que trabalhava para o MI6, tínha-o recrutado em 72.
Um ano mais tarde, e graças também às sua ligações em Oxford, entrou em contacto com a Irmandade de Amor Eterno e começou a fazer contrabando de grandes quantidades de marijuana a EE.UU. Não obstante, em pouco tempo tudo deu uma grande volta. A sua colaboração com a MI6 terminou depois de um caso de contra-espionagem, em EE.UU. descriram os seus carregamentos e MacCan esteve no ponto de ser executado pela RIA, sendo que já não podia contar com a sua ajuda.
O panorama complicou-se e foi realmente preso na Holanda em 73, mas em pouco tempo conseguiu a liberdade condicional. Em 1974 já estava a fazer novos negócios. Conseguiu que a máfia nipónica Yakuza transportasse centenas de quilos de haxixe nepalês para Nova Iorque, onde a Irmandade o distribuía. Fazia de ponte entre os seus clientes norte-americanos e os produtores do Oriente Distante. Ganhou muito dinheiro.
O encantador Mr. Nice e o seu império
Assegura que por esta altura tinha mais do que 40 identidades falsas, com os seus respectivos passaportes. Com a polícia seguindo-lhe os passos decidiu conseguir mais uma nova identidade. Donald Nice era um assassino que tinha cumprido cadeia, que nunca tinha saído do país sendo que não precisava do seu passaporte, e era uma pessoa real que podia fazer sem problemas trâmites administrativos se as circunstâncias assim o exigissem. Marks comprou o seu passorte e desde então passou a ter o apelido de Mr. Nice, com o qual se tornou mundialmente conhecido.
Os anos seguintes foram o seu apogeu como traficante de marijuana: Mr. Nice chegou a transportar 30 toneladas de marijuana parao Norte da América e contou com a colaboração da Máfia, da Yakuza, da Irmandade de Amor Eterno e do exército tailandês, das forças armadas palestinianas, da Organização da Liberação da Palestina e até dos monges nepaleses. Afirma que nunca teve nenhum problema de mal interpretações nem de violência com os seus sócios.
Em finais dos anos 70 fazia contrabando de marijuana da Colômbia para a Inglaterra em quantidades tão grandes que poderia satisfazer o consumo de um país durante um ano. Mas a polícia deteve-o no ano de 1980 e desta vez havia muitas provas contra ele. Mesmo assim, Marks tinha uma boa estratégia: declarou-se inocente e disse que era um agente coberto que trabalhava com a MI6 e os Serviços Secretos. Apesar de já não colaborar com eles há muitos anos, o jurado acreditou, salvou-se de todos os crimes de narcotráfico e apenas o declararam culpado por usar passaportes falsos.
Dois anos mais tarde, de volta à liberdade, tentou fazer negócios legítimos, mas a sua situação económica era do pior, sendo que voltou para o mesmo negócio. Howard voltou ao Oriente Distante e conheceu Salim Malik, um paquistanês exportador de hash. A amizade entre eles continua até aos dias de hoje. Por sua vez, fez contacto em Bangkok e continuou a servir de ponte entre os productores orientais e os seus contactos da EE.UU. Colaborou também com um agente da CIS e estabeleceu novos contactos na China.
Em 86 estabeleceu-se em Maiorca e continuava a ganhar milhões com os seus negócios internacionais. Mas a DEA viria a apertar o cerco para com ele. Após anos de estuds e seguimentos, começaram as detenções. Quando Howard decidiu colocar-se de lado e dedicar-se à venda legítima de vinhos, já era demasiado tarde.
Máxima Segurança
Em 88 deteve-o a DEA, em colaboração com a Scotland Yard e outras organizações de numerosos países. Em consequência da operação “Eclectic” houve também várias detenções em Inglaterra, Tailândia, Paquistãon, Espanha, Suiça, Holanda, Filipinas, EE.UU. e Canadá.
Marks esteve preso em Palma, passou para cadeia de Modelo de Barcelona e depois em Madrid, até ser extraditado para os EE.UU. para a Audiência Nacional. Apesar de Marks dizer que não um grupo criminal organizado, reconheceu que a maior parte dos crimes que eram apresentados contra ele eram verdadeiros.
O julgamento começou em 1990, muita gente com quem tinha trabalhado testemunhou contra ele e os gastos legais consumiram a fortuna que detinha. Assim sendo, a sentença foi de 25 anos e conseguiu logo a seguir reduzi-la para 20 anos, saiu finalmente em liberdade após 7 anos em Terre Haute, uma das prisões federais de maior segurança.
O seu comportamento como preso foi exemplar. Para além de ter escrito a sua famosa autobiografía, Mr. Nice, e de ter assistido às aulas de yoga, dava aulas de línguas a outros prisioneiros, ajudava-os com os seus exames, fazia de advogado e conseguiu mesmo revogar algumas sentenças. Estas actividades, valeram-lhe a redução da sua sentença e o respeito dos outros prisioneiros, para além da amizade de várias pessoas.
Marks lembra os seus anos na cadeia como uma experiência que o transformaria, tornando-o numa melhor pessoa segundo as suas próprias palavras.
A Reinvenção de Mr. Nice
Uma vez fora da prisão, a vida do famoso traficante mudou por completo. Sabia que o seguiam vigiando-o de perto e renunciou ao regresso das suas aventuras de fronteiras, carregamentos e alfândegas. Continua a desfrutar dos seus charros, sobretudo de hash do Nepal, mas a sensação de adrenalina consegue-a agora obter sempre que sobe ao palco.
Hoje em dia é comediante de stand up. Um dos seus espectáculos mais conhecidos, Uma Audiência com Mr. Nice, é já mítico e nele fala da sua vida como traficante e o seu ponto de vista sobre as drogas e a sua legislação. Tem excelentes críticas e grande popularidade em Inglaterra e Europa, mas em EE.UU já não por estar proibido de regressar para sempre.
Howard foi sempre um amante de música, e nos últimos anos entrou num mundo musical contemporâneo colaborando, por exemplo, com Super Furry Animals ou com o ex-guitarrista dos Happy Mondays. Também faz de Dj, onde se nota a sua preferência pelo Dub Step e lançou um selo discográfico, "Bothered". Para além disso, participou em séries e filmes como Dirty Sanchez ou Human Traffic. Produziu recentemente um filme baseado na sua autobiografia, que se chama também Mr. Nice.
Entre todas as suas actividades, Marks participou também na política, mas exclusivamente em assuntos relacionados com a legalização da marijuana em Inglaterra. Mas sobretudo, escreve. A sua autobiografia Mr. Nice tem sido um êxito de vendas, traduzida em vários idiomas. Depois publicou uma continuação, entitulada de Senhor Nice, algumas compilações de relatos e está actualmente a trabalhar numa trilogia policial, Sympathy for the Devil. Como se fosse pouco, é colaborador de medias como The Observer, The Times, Daily Telegraph, The Guardian ou GQ, entre outras.
Se quiseres saber um pouco mais sobre o lendário Mr. Nice, podes ver notícias e informação sobre as suas actividades na sua própia página web, e ver esta fantástica entrevista (em inglés), que apesar de ser longa não é desperdício nenhum!
E por conseguinte continua ligado à marijuana, desta vez de maneira totalmente legal, participando em bancos como o seu próprio nome, Mr Nice Seeds ou, junto com Shantibaba, na CBD Crew.